ESPOSA NO LUGAR DE MÃE, MARIDO NO LUGAR DE FILHO


Basta uma observação honesta da realidade, própria ou alheia, para encontrar um problema muito comum entre os casais: seus comportamentos no dia a dia não condizem com o papel social que escolheram viver.

Em outras palavras, a esposa assumiu no casamento a função de mãe do marido e este vive a relação conjugal na posição de filho. O contrário também acontece, o marido que ocupa o lugar de pai e a esposa o lugar de filha. O papel social é um, o comportamento outro, desalinhado. Normalmente, essa dinâmica ocorre de modo inconsciente. Essa “desordem” acarreta uma quantidade enorme de problemas na vida das pessoas.

É importante esclarecer, que no percurso do desenvolvimento afetivo normal de todas as pessoas, a escolha do par: namorado ou namorada, marido ou esposa, tem inevitavelmente a influência das primeiras referências das figuras femininas e masculinas representadas por pai e mãe ou substitutos. Não é desta normalidade do desenvolvimento afetivo que o artigo trata, o foco aqui é perceber uma desordem específica que gera sofrimento nas relações. Um lado se sobrecarrega, adoece e outro se mantém infantilizado, estagnado no desenvolvimento psicológico.

Para identificar essa disfuncionalidade nos papéis, primeiro é preciso saber o que é esperado de modo saudável:

Na relação entre adultos, neste caso, conjugal, a expectativa é que prevaleça uma TROCA: um ajuda o outro, há um equilíbrio, afinal os dois são adultos. Em tese, ninguém se sobrecarrega em excesso salvo alguma eventualidade. Essa troca não precisa ocorrer necessariamente na mesma “moeda”, as pessoas têm habilidades e vocações diferentes, o importante é o ajuste na dinâmica do casal onde compartilham os esforços para a resolução dos problemas.

Na relação entre pais e filhos, até certa idade, estes RECEBEM dos pais: afeto, cuidados, alimento, educação, estudos, condições materiais, valores, etc. Aqui a relação não é entre iguais, é entre adulto e criança.

Depois de bem definido o que é esperado nas relações saudáveis, é mais fácil identificar as descompensações:

Uma esposa que se comporta como mãe do marido, normalmente é provedora como a mãe. Esse lugar de provedora pode ter diferentes jeitos, comumente se coloca como provedora material. O casal mora na casa da esposa, ela assume grande parte das despesas do orçamento doméstico, se os filhos têm algum problema na escola ou de saúde ela resolve sozinha, sem o apoio do marido. Este no papel de filho ocupa o lugar de quem mais recebe, predominantemente, no casamento.

Nesta desordem de papéis, normalmente a mulher está sempre estressada, com problemas de saúde, preocupada e ansiosa, de fato, as responsabilidades são pouco divididas. Depois de um dia de trabalho, ela ainda faz algum curso à noite, uma especialização para ganhar mais, enquanto o marido assiste ao jogo de futebol ou maratona Netflix, afinal criança precisa se divertir.

A desordem, busca a ordem. A observação da realidade demostra que a mulher já sente ou sentirá em algum momento a falta do homem adulto que está AUSENTE na relação conjugal e isso poderá ter outros desdobramentos.

Um marido que se comporta como pai, e a esposa no papel de filha tem dinâmica semelhante, apenas muda quem é o provedor, ele e a passiva recebedora, esposa no lugar de filha. Ele é o provedor material, a mulher está sempre exigindo compras, cartão de crédito com mais limites, outro carro novo, viagens, sempre na posição de “me dá alguma coisa”.

Neste lugar de criança, a esposa normalmente não ajuda o marido nos problemas, é negligente com as necessidades afetivas e emocionais dele, a posição não é de troca, de quem pensa junto os problemas dos adultos, quer apenas receber. Normalmente, a vida sexual do casal também é afetada. Aqui também, o movimento é o mesmo, a desordem busca a ordem e em algum momento este marido sentirá falta da mulher adulta que está ausente na relação.

Em momentos de desabafo, até ouvimos homens dizendo que tem uma filha a mais, citando a esposa. E, mulheres também mencionando um filho a mais, sobre o marido. Entretanto, nem de longe, eles têm consciência do tamanho do problema e das consequências envolvidas.

Entender o funcionamento desta dinâmica disfuncional é o primeiro passo para realizar as mudanças necessárias: marido e esposa alinhados e coerentes nos comportamentos com os respectivos papéis sociais assumidos, desse modo, podem experienciar apoio e crescimento mútuos durante a vida. Nem sempre essa disposição existe entre os envolvidos, mas é um caminho possível para aqueles que se dispõem a crescer emocionalmente.


Adriana Alves de Lima

Psicóloga