Na prática Clínica, na observação dos relacionamentos vivenciados no cotidiano, é muito comum encontrar alguém sofrendo porquê o outro lhe fez algum ou muitos desaforos. Aqui concentro a análise em relações com convivência frequente e não em encontros fortuitos.
Segue
um recorte para facilitar a análise:
-
Hoje eu estou irado com meu colega de trabalho!
Por
que?
-
Durante a reunião na empresa, com nosso gerente, meu colega disse que eu queria
falar do problema X. Ele escolheu o meu assunto da reunião. E nosso gerente
aceitou e ainda me deu a solução do problema. E pasme! Eu nem pretendia levar o
problema que ele escolheu por mim, pretendia falar sobre outro, que considero
mais difícil.
Como
você se sente?
- Estou me sentindo depreciado, menosprezado e
com muita raiva, nem consegui falar com ele depois da reunião.
Pelo
seu estado emocional, tudo indica que você o acha culpado pelo estresse, seu
sofrimento.
-
Claro que sim!
Eu
lhe digo que ele não é o culpado.
-
Como não?
Colocá-lo
como culpado, faz você não olhar para a sua responsabilidade neste problema.
Vocês convivem há tempos?
-
Sim, trabalhamos nesta empresa há 5 anos.
Certo.
Você
tem 2 caminhos aqui para enfrentar este problema, considero um bem mais
produtivo que o outro.
-
Quais?
Primeiro,
continuar a fazer o que já fez, colocando-o como culpado, e novamente, sentirá
raiva. Talvez ela passe e vocês continuem na mesma qualidade de relacionamento,
até o próximo desaforo.
Segundo,
mais saudável, você analisa comigo como esse desrespeito foi construído com a
SUA permissão. Para chegar nesta situação, você permitiu muitos desaforos
menores e sua omissão mostrou a ele que pode lhe tratar desse modo.
-
É verdade! Outro dia, na hora do almoço, no trabalho, ele ficou rindo do
tamanho do meu prato, e falava para todos os que passavam.
E
o que você fez nesse dia, falou para ele que não gostou do modo como ele lhe
tratou?
Não
falei nada, mas fiquei, muito chateado.
Esse
é o problema, “quem cala consente”, mas você pode desenvolver outras
habilidades de relacionamento além dos aprendidos na infância como “não brinco
mais”, “ficar sem se falarem.”
-
Certo, você está dizendo que eu permiti ser mal tratado em muitas outras
situações e não me posicionei sobre minha insatisfação. Essa permissão
inconsciente cresceu tanto que gerou uma afronta muito maior como a manifestada
na reunião?
Isso
mesmo!
Eu
disse que esse caminho é mais produtivo porque faz você crescer, e não ficar
imobilizado na vítima impotente que apenas se ressente e não muda EM NADA seu comportamento.
-
Realmente, você me mostra um caminho bem inovador.
Em
outras relações, também reproduzo este padrão de comportamento: ressentido e
magoado com outras pessoas do meu convívio, inclusive minha namorada.
Neste
caso, falta colocar limites nas relações. No caso daquela reunião, você já
percebeu que não começou ali o desrespeito. Entretanto, você poderia ter falado
na reunião:
“Colega,
agradeço sua ajuda, mas EU quero falar por mim. E quero nesta reunião analisar
OUTRO problema com nosso gerente”.
-
Entendo, faltou limite e também coragem para colocá-lo. Obrigado.
Adriana Alves de Lima
Psicóloga